- INTRODUÇÃO
A organização estatal é construída sob influência de múltiplos fatores,
entre eles, a composição étnica do povo, o tamanho do território, os elementos
socioculturais e, principalmente, as instituições políticas governativas. Esta é a
matéria prima sobre a qual se erige o modelo político característico de cada
nação. Não se ignora também que o grau de maturidade democrática é um dos
fatores preponderantes para o desenho institucional e para o exercício da
soberania.
O Estado Federal tem seus contornos modernos derivados da revolução
norte-americana, momento em que os pais fundadores dos Estados Unidos
construíram fórmula de cooperação política para que as ex-colônias britânicas
conjugassem forças para viabilizar a existência autônoma do território recém
emancipado na América do Norte.
Do ponto de partida na independência americana, o modelo federativo
passou a ser replicado, adaptado e modificado por outras nações, mantendo,
entretanto, características fundamentais de participação efetiva na condução
das políticas públicas do Estado, e, da autonomia para existir e autogovernarse em relação aos outros membros componentes da União.
Neste trabalho, faz-se um rápido sobrevoo sobre a teoria do federalismo
e sua evolução de um modelo descentralizado clássico e sua mutação para o
formato de sua aplicação atual no Brasil, onde a União exerce papel
predominante sobre os demais membros.
Em sequência, examina-se movimentos de descentralização do arranjo
cooperativo federalista através da transferência de competências e
responsabilidades. A elevação do município à condição de membro da
1 Advogado, MBA em Direito da Economia e da Empresa FGV/RJ, MBA em Direito Tributário FGV/RJ, membrofundador da ABRADEP, mestrando em Direito, www.ceotto.adv.br; luciano@ceotto.adv.br.
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federação é pontuada como o ápice do poder local para prestar serviços
básicos como educação, saúde e saneamento.
Então, põe-se em foco as ambiciosas metas traçadas pelo novo marco
do saneamento básico (Lei n.º 14.026/2020, que alterou a Lei n.º 11.445/2007)
e a dificuldade estrutural para que os municípios exerçam as competências que
lhes foram atribuídas pelo texto constitucional.
A exitosa contribuição que os consórcios públicos têm apresentado em
termos de cooperação vertical e horizontal interfederativa sugere que o modelo
pode ser replicado nos assuntos afetos ao saneamento básico, pois tem
capacidade para alcançar escala econômica e técnica que, isoladamente, o
poder local não detém.
- FEDERALISMO E DESCENTRALIZAÇÃO POLÍTICA
A caracterização de um estado como federativo admite as mais variadas
flexões na extensão e na distribuição de poderes. Seu conceito doutrinário é
também objeto de dissenções na ciência política e nos manuais jurídicos de
Teoria Geral do Estado.
Entretanto, há ponto comum quanto a sua característica mais básica que
é a divisão garantida de poder entre governos centrais e regionais (LIJPHART,
2021). A definição mais conhecida foi a cunhada por W. Riker de que:
“Federalismo é uma organização política na qual as atividades governamentais
estão divididas entre os governos regionais e um governo central de tal
maneira que cada um desses governos tenha algumas atividades sobre as
quais tomará decisões finais” (RIKER, 1975, p. 101 apud LIJPHART, 2021). A
definição Estado Federal, na concepção de Jellinek, é a de: “Estado soberano,
formado por uma pluralidade de Estados-membros, ligados numa unidade
estatal” (G. JELLINEK, apud BONAVIDES, 2015, p. 193).
Mesmo caracterizando o estado federal como uma união de entidades
dotadas de autonomia, essa coletividade projeta efeitos de estado simples no
que toca sua representação soberana externa, pois suas relações diplomáticas
são monopólio do poder central. Vale dizer que, para o direito Internacional
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Público, a soberania tanto do Estado Federal quanto do Estado Unitário, via de
regra, são indistinguíveis.
Os contornos do estado federal são dados pelo Direito Constitucional
que define seu modelo de organização interna, as atribuições dos entes
subnacionais, os graus de autonomia administrativa e de participação na
atividade legislativa da união.
Naturalmente, os modelos federativos vêm sofrendo mutações desde o
congresso da Filadélfia de 1787, ano em que os representantes de treze
estados norte-americanos se reuniram e criaram o modelo federativo clássico.
Ao longo do tempo os legisladores e atores políticos influenciados pela
proeminência da realidade sociocultural vigente em cada amostra histórica
reconfiguraram as relações interfederativas com variações entre a
centralização e a descentralização de poderes, como também nas relações
verticais e horizontais do estado federal.
Num primeiro momento, identifica-se predominância da autonomia dos
estados-membros em face da união. Nesse período, Toqueville profetizava o
risco de dispersão decorrente dos fortes poderes regionais e grande autonomia
dos membros componentes do coletivo estatal (BONAVIDES, 2015, p. 203).
Seguiu-se uma segunda fase, em que exsurgia uma busca pelo perfeito
equilíbrio entre a autonomia das unidades constitutivas e sua participação na
união, com submissão à Constituição Federal que mantém atadas as relações
dos membros entre si, e, entre cada um e a entidade nacional.
Contemporaneamente, verifica-se o oposto da primeira fase, podendo
identificar-se tendência de desequilíbrio em prejuízo dos estados-membros. A
dinâmica das relações transnacionais e o alargamento das vias de comércio
solaparam as especificidades políticas para estabelecer o predomínio da união
sobre os entes subnacionais. Paulo Bonavides (2015) explica o fenômeno:
“…o imenso progresso tecnológico de caráter unificador, a propagação
das ideologias que apaga e crestam as variações do particularismo
político, erigindo camadas maciças e uniformes de opinião, o
consequente incremento da legislação social apaziguadora do conflito
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entre o trabalho e o capital e o excesso de dirigismo econômico se
apresentam como fatores principais da transformação já operada. Tal
transformação já sacrificando a competência efetiva dos Estadosmembros, colocou os Estados, em face da deficiência de seus recursos,
debaixo da servidão financeira do poder federal (de sorte que já não
podem estes sobreviver fora das subvenções do erário da União) e
desenvolveu em suma nos cidadãos mesmos certo sentimento de
menoscabo ou de ruinosa indiferença às prerrogativas autonomistas
das unidades componentes, o que, em algumas Federações como o
Brasil e os Estados Unidos, veio avolumar as correntes de opinião mais
favoráveis aos interesses da União, identificados portanto como
interesse nacional contraposto ao dos Estados, o qual se principiou a
condenar por representativo de formas de egoísmo e particularismo.”
Se por um lado a centralização do poder serve à redução de
desigualdades regionais, distribuição de riquezas e a ascensão nos índices de
desenvolvimento das unidades mais pobres ao patamar daquelas mais
desenvolvidas, lado outro, mostra-se incapaz de resolver questões pontuais ou
mesmo de distribuir igualitariamente os direitos fundamentais e os de bemestar social inseridos nas constituições modernas. Os arranjos econômicos
locais não têm se mostrado aptos a atingir máxima eficiência sem tratamento
particularizado e próximo, denotando falha na implementação de políticas
públicas por indução vertical do poder central em direção dos órgãos e entes
subnacionais.
Nesse sentido a distribuição de competências permite aos governos
locais terem suas próprias agendas econômica e social. Arretche (2004) ilustra
o ponto utilizando como exemplo o objetivo nacional de elevar os padrões de
qualidade do ensino fundamental em vista dos baixos índices de desempenho
dos estudantes brasileiros. A consecução de tal desiderato pressupõe o
envolvimento direto das administrações estaduais e municipais, que são os
gestores das redes de ensino. Assim, conclui-se que a forma como estão
estruturadas as relações federativas nas políticas específicas para a educação
afeta as estratégias possíveis para coordenação vertical das políticas
nacionais.
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Com efeito, a autonomia dos entes subnacionais e a intensidade de
centralização de poder só pode ser repactuada tendo-se em vista o tamanho
da fatia do bolo tributário atribuído a cada ente da federação. Impossível
caracterizar uma unidade político-administrativa como membro de Estado
Federal, sem que haja garantia constitucional de receitas próprias suficientes
para o cumprimento de suas competências.
O caso brasileiro evidencia forte concentração tributária para a União,
com parcela pouco significativa para os Estados-membros, e, apenas fração
residual para os Municípios. De tal sorte, se a política pública local depende de
transferências voluntárias da União e não está assegurada por fluxo perene de
recursos fiscais, tal característica aproxima-se mais do conceito de
desconcentração administrativa do que de cooperação federativa.
Afigura-se-nos que as Assembleias Constituintes de 1946 e de 1988
foram momentos históricos de descentralização federativa, onde buscou-se
implementar as políticas púbicas por meio do fortalecimento dos Estados e
Municípios.
Feitas as considerações gerais sobre Teoria da Federação, sua
evolução e breves destaques acerca de suas principais características, passase a dissertar sobre o poder local na federação brasileira. - O MUNICÍPIO COMO ENTE FEDERATIVO
A concepção tradicional do Estado Federal, de forma muito sintética,
pressupõe a existência de elementos mínimos tais como a capacidade de
autogoverno, a eleição de representantes legislativos (locais e nacionais), a
instituição e arrecadação de tributos, e, de um Poder Judiciário independente e
apto a fazer valer as normas constitucionais. Nesse contexto, respeitáveis
posicionamentos como dos administrativistas José Nilo de Castro não
reconhecem o município como integrante do estado federal, já que lhe faltariam
elementos mínimos de autonomia e participação.
O modelo federal brasileiro tem origem na constituição republicana de
1891, deitando raízes no estado unitário, de regime monárquico e com poder
muito centralizado como era no séc. XIX. Então, diferentemente da experiência
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norte-americana em que o estado federal foi constituído pela reunião de treze
ex-colônias inglesas autônomas, o modelo brasileiro surge da repartição do
território e da transformação de províncias em estados. A partir da vigência da
primeira constituição republicana do Brasil, os Estados e Municípios passaram
a integrar a estrutura federal, mas com limitada autonomia e participação na
condução dos negócios públicos.
Igualmente peculiar foi a elevação do município à condição de ente
federativo, porquanto embora decorrente de opção política descentralizadora
com origem na Constituição de 1946, foi categorizado como membro
participante da federação por ficção constitucional prevista nos artigos 1º e 18
da carta de 1988. Sob o ponto de vista teórico Melo Filho (2013) adjetiva o
complexo modelo brasileiro sob a concepção de que há três esferas
governamentais superpostas sobre o mesmo território.
Assim, não obstante o artificialismo e a forma particular do federalismo
brasileiro (ARRETCHE, 2010), aos municípios foram atribuídas competências
comuns aos demais integrantes da federação, notadamente com relação às
políticas públicas descritas no art. 23 e incisos da Constituição de 1988.
Notadamente, os municípios situam-se em posição de desvantagem
político-administrativa frente aos demais integrantes do estado federal. A
arrecadação de tributos é extremamente desigual no plano horizontal, isto é,
entre os governos subnacionais (ARRETCHE, 2004). Embora a concentração
de poderes e riquezas no ente nacional seja fenômeno relativamente comum, o
movimento de descentralização das políticas públicas expõe a fraqueza
institucional do órgão de poder local impondo enorme pressão sobre seus
atores políticos. Sobre a tendência de transferência de responsabilidades para
o âmbito local, interessante o trecho de João Mendes Rocha Neto, a saber:
“A municipalização se constitui em um movimento que reconhece o
município como principal responsável pela implementação de algumas
políticas públicas. Nesse sentido, o entendimento do processo de
municipalização seria a transferência para as cidades das
responsabilidades e, em tese, dos recursos necessários para exercerem
plenamente tais funções.”
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Então, resta aos municípios encontrar mecanismos de cooperação
federativa para, frente ao imenso peso da implementação das políticas publicas
que lhes são delegadas, cumprir com as competências a eles
constitucionalmente atribuídas. O consorciamento intermunicipal, como método
de realização da cooperação federativa, apenas começou a ganhar um
arcabouço legal com a emenda constitucional n.º 19, de 1998, a qual, no
entanto, também demandava lei regulamentadora.
Ainda que o modelo cooperativo do consorciamento já existisse até
antes da atual carta magna, apresentava-se como ferramenta de atuação
multilateral precária, posto que se constituía por convênio, não possuía
personalidade jurídica própria e havia a possibilidade de denúncia unilateral por
parte dos seus membros sem implicações diretas com relação às obrigações e
direitos do consórcio (LINHARES e CUNHA, 2010).
Passados mais de sete anos da constitucionalização do arranjo
cooperativo, foi aprovada a Lei n.º 11.107/2005 conhecida como Lei dos
Consórcios Públicos, cuja utilização, sobretudo na área de saneamento e meio
ambiente, vem experimentando pronunciado crescimento desde então. - O CONSÓRCIO INTERMUNICIPAL COMO INSTRUMENTO DE
COOPERAÇÃO FEDERATIVA NA ÁREA DO SANEAMENTO
Como já dito em linhas transatas, a Constituição de 1988 caracterizou-se
como um movimento descentralizador do pacto federativo brasileiro,
transferindo aos municípios novas competências para a formulação e
implementação de políticas públicas.
A partir da nova carta constitucional o saneamento básico passou a ser
competência comum entre União, Estados, Distrito Federal e Municípios (art.
23, inc. IX, CRFB). Muito embora a competência legislativa para instituir as
diretrizes para a política de desenvolvimento urbano, inclusive habitação,
saneamento básico e transportes urbanos tenha permanecido sob competência
da União (art. 21, inc. XX, CRFB), inegável o incremento da participação do
poder local em relação à dinâmica anteriormente vigente.
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Com o novo marco legal do saneamento, cujas metas de universalização
inclui a garantia do fornecimento de água tratada para 99% da população e
90% de esgotamento sanitário até 2033, o Estado brasileiro assumiu
ambiciosas pretensões de resgatar o enorme déficit na prestação dos serviços
básicos. A nova estratégia de universalização aposta no modelo cooperativo e
de compartilhamento de atribuições em contraposição ao modelo concentrador
do antigo PLANASA, que mesmo apostando na sinergia econômica das
companhias estaduais de saneamento e contando com recursos para
financiamento específico não conseguiu alcançar a maciça ampliação dos
serviços de água e esgoto.
Então, aos municípios foram impostas responsabilidades na área do
saneamento básico que antes eram, no máximo, objeto de descentralização
vertical. Isso criou inusitada situação porque, em regra, a maior parte dos
municípios brasileiros sofre com alto grau de dependência de repasses da
União (ROCHA NETO, 2022), e não possuem a mínima capacidade para
figurar como titular da prestação dos serviços de saneamento básico. Assim,
sujeitá-los ao mesmo plano de obrigações onde figuram os Estados e a União,
mercê das inovações trazidas pela Lei n.º 14.026/2020, e mais recentemente,
pela MP n.º 1.157/2023, pode significar mais uma falha histórica no objetivo de
universalização dos serviços.
João Mendes da Rocha Neto aponta que: “Adicionalmente, apresenta-se
um complexo cenário institucional com atribuições partilhadas não só no âmbito
vertical, em que diversos órgãos federais atuam nas mesmas funções
programáticas, criando um emaranhado de difícil compreensão para os
municípios, a exemplo do saneamento básico…”
Nesse contexto, necessária a criação de mecanismos de articulação
federativa capazes de induzir tanto a cooperação entre os entes
corresponsáveis pela execução da política pública de saneamento, quanto para
induzir os entes federados a agirem em favor dos interesses comuns.
Entretanto, a mera predisposição cooperativa não é suficiente para a produção
de resultados satisfatórios, sendo necessário instrumentalizar a ação
coordenada com a distribuição de tarefas, apontamento de fontes de custeio e
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fixação de marcos jurídicos que deem previsibilidade e segurança jurídica aos
interessados.
Desde a primeira década do séc. XXI o consórcio público calçado na Lei
n.º 11.107/2005, vem se mostrando como ferramenta eficiente de articulação
federativa intermunicipal. Os êxitos alcançados na área da saúde encorajam a
utilização do modelo como solução para a falta de escala econômica da maior
parte dos municípios brasileiros para fazer frente às metas de universalização
no tratamento de água e nos serviços de coleta, afastamento e descarte de
esgoto.
A tendência de arranjo federativo através de consórcios foi pontuada por
Linhares, Messenberg e Ferreira (2017), vejamos:
“A cooperação federativa horizontal, da qual o consórcio intermunicipal
é apenas uma das modalidades, decorre efetivamente da Constituição
de 1988, uma vez que esta contemplou um modelo federativo
descentralizado e cooperativo como forma organizacional do Estado
brasileiro.
Tal característica expressa-se por extensas e importantes áreas de
atuação pública com competências concorrentes e comuns. Cabe
observar que esse não foi um produto do acaso. Sua escolha decorreu
da consideração dos constituintes em relação aos efeitos pretendidos
pela forma de Estado adotada.
Sabidamente, esse arranjo não é neutro em relação às consequências
transformadoras que ele é capaz de induzir no âmbito das relações
sociais e da atuação da Administração Pública. Uma federação
cooperativa descentralizada pode fomentar a inovação na
Administração Pública, o protagonismo da sociedade civil, bem como a
promoção de maior equidade no acesso aos serviços públicos entre
cidadãos localizados em diferentes jurisdições.”
Segundo estudo técnico da Confederação Nacional dos Municípios
(2009), não mais de 16,59% do bolo tributário nacional fica com as
administrações locais. Também, a expressiva fragmentação territorial havida
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entre os anos de 1988 a 2022, redundaram em quadro de indigência
orçamentária dos municípios.
Nesse contexto, o consórcio se apresenta como ferramenta eficaz para a
falta de escala na execução de políticas públicas e no provimento dos serviços
de competência local. A redução dos custos médios operacionais revela-se
como estímulo positivo para a cooperação federativa horizontal, explicando o
exponencial crescimento desse modelo de arranjo institucional na última
década.
A despeito do expressivo crescimento do número de consórcios
públicos, este não tem seguido padrão linear em todas as unidades da
federação. Variáveis socioculturais, dimensão territorial e quantitativo
populacional entre os diferentes Estados-membros são possíveis explicações
para a desigual distribuição geográfica dos consórcios públicos. Percebe-se,
assim, que em estados como Minas Gerais, Mato Grosso e Paraná, uma
proporção muito expressiva de municípios participa de um ou mais consórcios.
Já em outros estados, como Amazonas, Tocantins, Piauí, Roraima e Amapá,
tal frequência torna-se acontecimento raro (Linhares, Messenberg e Ferreira,
2017).
Não obstante, nas regiões em que tem sido experimentado, o laboratório
institucional do consórcio tem alcançado positivos resultados na área de saúde,
apresentando-se como eficiente ferramenta através da qual as relações de
poder se processam de modo mais horizontal. Isso o credencia como
instrumento apto a produzir resultados igualmente positivos com relação às
metas de saneamento fixadas pela Lei n.º 14.026/2020.
Campo igualmente promissor para o modelo consorciado é o da
regulação e de fiscalização. Notadamente, o policiamento da operação e
auditagem no cumprimento de obrigações contraídas pelos executores dos
serviços, obras e metas do saneamento, demandam atividade técnica e
especializada com pesada estrutura burocrática com elevados custos de
manutenção. Então, especialmente para os pequenos municípios a ferramenta
do consórcio se mostra animadora, não só pelo compartilhamento de
despesas, mas cormo alternativa à adesão as agências estaduais, além de
prevenir conflitos de interesse e ingerências eleitoreiras circunstanciais.
11/12 - CONCLUSÕES
O modelo de organização federativa é adotado apenas por uma minoria
de países. Não obstante, em se considerando as nações com sólidas
instituições democráticas, relevante parcela, senão a maioria vivem sob
estruturas políticas federativas.
O modelo tem servido ao fortalecimento das nações e de sua
democracia. Seja para unir forças, como no caso dos Estados Unidos e da
União Europeia, cujas características são mais próximas de confederação, ou,
seja para descentralizar o poder, como ocorreu nos casos de Brasil (1892),
Índia (1950), Espanha (1976) e Bélgica (1993), o federalismo é adjetivo
indispensável para nações de grande população, ou de população multiétnica,
ou que busquem a redução de desigualdades regionais.
Na experiência brasileira, a partir da proclamação da república, a
desconcentração do poder central foi processo paulatino e continuo,
ressalvadas interrupções em períodos ditatoriais. Nessa toada os municípios
ganharam competências administrativas e relevância para a prestação e
execução de políticas públicas, sobretudo, a partir da Constituição de 1988
quando o ente municipal passou a ostentar a condição de membro da
federação em plano de igualdade formal com a União, os Estados e o Distrito
Federal.
A reforma trazida pela Emenda Constitucional n.º 19, de 1998, e,
posteriormente com a edição da Lei n.º 11.107/2005, reforçou e estruturou o
modelo de cooperação via consórcio, tornando-se ferramenta jurídica capaz de
apresentar resultados positivos em políticas interfederativas como a da Saúde.
O novo marco legal do saneamento estabelecido pela Lei n.º
14.026/2020, fixou metas de universalização da abrangência e prestação dos
serviços de água e esgoto que devem ser atingidas até o ano de 2033.
Decorrência da competência para o trato de assuntos de interesse local, o
município é o ente federativo que suporta a maior carga de responsabilidade
pelo sucesso dos objetivos traçados para a política de expansão dos serviços.
Tomando-se como padrão os positivos resultados alcançados pelos
consórcios intermunicipais de saúde, é de se esperar que a replicação do
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modelo de cooperação horizontal já experimentada seja a forma de melhor
desempenhar as competências locais para a área do saneamento básico.
Assim, tem-se alternativa segura, sob o ponto de vista jurídico, e viável
economicamente, capaz de produzir os resultados almejados pela estratégia
nacional para o setor. - BIBLIOGRAFIA
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¹ Advogado, MBA em Direito da Economia e da Empresa FGV/RJ, MBA em Direito Tributário FGV/RJ, membrofundador da ABRADEP, mestrando em Direito, www.ceotto.adv.br; luciano@ceotto.adv.br